Esse Texto é uma narrativa bem específica sobre como o Karatê influenciou e direcionou a minha vida e também uma forma, singela, de agradecer às pessoas que ao longo desses vinte e cinco anos, me ajudaram ensinando, aprendendo, “trocando” literalmente como se diz na gíria de lutador.
Comecei a treinar Karatê no Colégio da Polícia Militar, nos Dendezeiros, quando o comandante da Unidade fez um comunicado de que as aulas de Educação Física poderiam ser substituídas por turmas de esportes(futebol ou Karatê)... Minha mãe já havia treinado e sempre falava comigo que eu deveria começar, mas confesso que eu tinha medo de “levar porrada”, mas aos 14 anos achava que porrada fazia parte do processo de crescimento humano e me matriculei na turma. O Sensei Nilson Viana dava aulas no Clube de sargentos da PM, foi engraçado porque no primeiro momento em que eu pisei naquele espaço(DOJÔ) tive a estranha certeza de que faria aquilo pelo resto da minha vida, lembro que ficava treinando em casa, enquanto via tv, enquanto comia, antes, durante e depois do banho, estava fascinado, encantado! Aprendi as técnicas básicas do Karatê Shotokan até graduar para a faixa vermelha, com o Sensei Nilson, mas não sei porque motivo as aulas foram suspensas, só que “nessa altura do campeonato” eu estava completamente apaixonado pelo “Caminho das Mãos Vazias”, mais do que paixão, eu já amava o Karatê. Entrei em desespero, pois não sabia o que faria sem os treinos, mas meu pai era professor numa escola de ensino médio e tinha um aluno que era professor de Karatê, eles conversaram sobre minha angústia e por volta de meados de 1992 conheci o Sensei Alex Velame, um rapaz jovem e carismático que me apresentou ao Clube Conexão, onde mais tarde conheceria os Senseis Clécio, Gilmar, Roberto e Celso, os quais eventualmente faziam treinos conosco, como preparação para os campeonatos, éramos uma família grande e com problemas como qualquer família grande, mas nos respeitávamos e nossa convivência era saudável.
O Karatê era mágico para mim, eu mudava ali dentro do kimono, dentro de um dojô, o mundo parava de girar pra eu socar, chutar, gritar, suar e me extasiar com a filosofia e o treinamento que fazia, o tempo foi passando, e a certeza sobre meu futuro ia se consolidando, já havia decidido que faria vestibular para Educação Física e que seria professor de Karatê; no final do ano de 1996 já estava estudando na Universidade Católica do Salvador e também estava empenhado em fazer o meu exame para a faixa preta, treinava cerca de três a cinco horas diárias, treinava na minha academia e também treinei com o professor que ensinara minha mãe, o saudoso Adelmo do dojô BUSHIDÔ em Mussurunga; ele me corrigia, me forçava ao meu melhor, mas ao final de uma semana de treinamento ele perguntou porque tanto esforço já que eu estava tecnicamente muito bem? Eu respondi que queria passar bem no exame para a faixa preta e nesse instante tive uma das piores notícias que alguém nas condições que estava poderia ter, ele virou-se para mim e disse que o período para inscrição do exame já havia encerrado... eu não tinha como saber, esperava que meu professor tivesse ajeitado tudo, pois ele sabia que do meu intuito, mas ele estava viajando para resolver assuntos pessoais e não me avisou dos prazos... Meu mundo caiu MESMO! Abandonei os treinamentos, fui pra casa chorar a decepção de ter o sonho adiado por mais não sei quanto tempo.
Hoje sei que fui imaturo de não ter reclamado com o meu sensei sobre ele não me avisar, sei que fui bobo em abandonar meu sonho, por trancá-lo por tanto tempo num frigorífico, passeei por algumas outras artes marciais, mas nada se comparava ao que sentia quando treinava Karatê, decidi então abandonar tudo, eu saí do Karatê, mas ele não saiu de mim. Fiquei quase 20(isso mesmo vinte) anos afastado de academias, mas jamais deixei de treinar em casa, acordava cedinho, relembrava os katas(lutas imaginárias contra diversos adversários) que preparam para situações de combate real e os kihons(fundamentos técnicos – golpes), fiquei assim até decidir que realmente precisava terminar um ciclo para começar outro, já morava em Camaçari quando ouvi falar do Professor Alberto na Cidade do Saber, fui a ele e contei parte da minha história, dizendo do meu interesse em retornar aos treinamentos, fui bem recebido, mas os horários de trabalho frustraram mais uma vez meu intuito e tive que parar, até que no final do ano de 2014, fui convidado a reencontrar meus antigos colegas de treino num encontro que prometia ser o reinício para muitos que, como eu, estavam afastados. Não vou negar que relutei em ir, não sabia se queria falar daquilo que tinha bloqueado há tanto tempo, mas fui e foi bom ter ido, revi amigos, revi meus fantasmas, enfrentei-os e obtive a promessa do meu antigo sensei de que ele iria fazer o possível para reparar o “mal entendido” do passado, realmente aquele encontro foi uma injeção de ânimo, ali mesmo amadurecemos a ideia da Associação Velame de Karatê(ASVEKA), mas como eu morava em Camaçari, não tinha condições de me deslocar com a frequência necessária para os treinos em Salvador, fui lá poucas vezes e voltei ao sensei Alberto pedindo guarida e orientação para meus treinamentos, fui novamente muito bem recebido e começamos os treinamentos, meus horários no trabalho mais uma vez impediram o treino que gostaria de ter tido, não fiz exame em 2015, mas fiquei feliz em saber que um companheiro de treino da mesma época que eu, Jaguaraci(“Mandíbula”), tinha se graduado faixa preta naquele ano, aquilo me encheu de energia para seguir seus passos e no início do ano de 2016 já havia planejado ter horários de trabalho que não impedissem meus treinamentos, me dediquei, treinei todo o primeiro semestre e depois do recesso junino demorei um pouco pra voltar, mas voltei, retomei contato com o professor Clécio Marback que me apoiou, ajudou e orientou, além de ser o coordenador do Clube que eu oficialmente ainda era filiado e do lado de cá, o sensei Alberto lapidava as técnicas e fundamentos que precisaria para lograr aprovação no exame. No dia 03/12/2016 fui para o local onde iria realizar finalmente meu exame de faixa, fui com Elisângela que acompanhou boa parte da minha história no Karatê, minhas alegrias, vitórias, aprendizados, angústias, sofrimentos e frustrações, conosco nossos filhos Fábio Júnior, faixa amarela, e Gabrielle que se encantou com o evento(mesmo não podendo assistir ao exame), pois viu jovens como ela graduando-se como faixas pretas. O exame foi fantástico, uma energia boa, limpa, harmoniosa e gostosa de sentir, foquei no “trabalho”, fiz o que fui lá para fazer(teste teórico e prático sobre a Arte Marcial que mudou minha vida). O lema do Karatê pautou minha vida desde quando iniciei a prática em 1991 e até hoje tento honrar cada um dos seus princípios:
- Esforçar-se para a formação do caráter
- Respeito acima de tudo
- Fidelidade para com o verdadeiro caminho da razão
- Criar intuito de esforço
- Conter o espírito de agressão
Ainda tenho em mim esse sentimento de curiosidade e aperfeiçoamento de um faixa branca, sou a prova de um jargão marcial que diz "O faixa preta é o faixa branca que nunca desistiu" e estou emocionado de verdade, mas são lágrimas de alegria, de uma certeza que estou(re)começando o meu caminho pronto pra absorver e engrandecer essa Arte que me transformou e me melhorou enquanto pessoa.
Hoje recebi o resultado do meu exame, sou oficialmente faixa preta 1º Dan de Karatê e aqui gostaria de citar algumas pessoas que me ajudaram nesse caminho:
A meus pais, meu pai por possibilitar meus treinos e “paitrocinar” meus exames e campeonatos e a minha mãe(minha primeira sensei) que corrigia meu primeiro kata na sala, enquanto repetia os movimento em frente a televisão;
Meu tio Ubirajara(faixa roxa) que sempre me incentivou com amizade e bons exemplos na vida;
Meus primos e minha tia Irá, que começaram depois de mim;
A Elisângela que aceitou meu convite para treinar e levou seu irmão;
Ao Sensei Nilson Viana(meu primeiro mestre) talvez sem ele não tivesse escrito esse texto e tudo fosse diferente na minha vida;
Ao sensei Alex Velame, que por muito tempo me orientou;
A todo o grupo Conexão, com especial menção ao Sensei Clécio Marback, que mesmo depois de tanto tempo afastado me acolheu com braços abertos e paciência;
A Jaguaraci, amigão, que além de treinar comigo, me cedeu material teórico para estudar;
A Tavares, Indio, Cleã, pela força para incentivar meu retorno;
Ao sensei Adelmo(in memoria) pelos socos pesados e treinamento extenuante;
Aos novos companheiros de treino da Associação de Karatê do Litoral Norte(ASKALIN) sob as batutas dos senseis Alberto e Leila;
Aos alunos que tive durante o tempo em que ensinava Karatê como monitor;
Aos companheiro de treino da ASVEKA – Associação Velame de Karatê, clube o qual me sinto co-fundador;
Sem vocês todos e cada um de vocês eu certamente não teria o que escrever nesse texto.
Sinto que agora recomeça minha caminhada, no Caminho das Mãos Vazias.
Meus respeitos e gratidão eterna pelo apoio. OSS!
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